A violência obstétrica é uma realidade enfrentada por inúmeras mulheres no Brasil, embora ainda pouco debatida. Ela ocorre quando a gestante, parturiente ou puérpera é submetida a práticas desrespeitosas, abusivas ou desnecessárias durante o pré-natal, o parto ou o pós-parto. Mais do que uma questão de conduta médica, trata-se de uma violação de direitos humanos e de princípios fundamentais de dignidade, autonomia e integridade física e emocional.
A falta de informação sobre o tema contribui para que muitos desses abusos permaneçam invisíveis. Conhecer o que configura a violência obstétrica e quais são os direitos da gestante é essencial para prevenir essas situações e garantir um parto seguro, respeitoso e humanizado.
O que é violência obstétrica?
A expressão “violência obstétrica” abrange qualquer ação ou omissão que cause dor, sofrimento, constrangimento ou desrespeito à mulher no contexto da gestação, parto ou puerpério. Pode envolver procedimentos médicos realizados sem consentimento, recusa de atendimento adequado ou ainda condutas verbais e psicológicas abusivas.
Ela pode ser:
Física, quando há intervenções desnecessárias ou dolorosas sem justificativa clínica;
Psicológica, por meio de humilhações, ameaças ou coerções;
Verbal, quando a paciente é alvo de ofensas ou comentários degradantes;
Institucional, quando o ambiente hospitalar nega direitos básicos, como o de ter um acompanhante.
A violência obstétrica viola direitos previstos na Constituição Federal, no Código Civil e em tratados internacionais de proteção à mulher, como a Convenção de Belém do Pará, que define a violência de gênero como qualquer ato que cause sofrimento físico, sexual ou psicológico.
Exemplos de violência obstétrica
Muitas práticas naturalizadas no sistema de saúde podem configurar violência obstétrica. Entre os exemplos mais comuns estão:
Negar anestesia ou tratamento para dor sem justificativa médica plausível;
Impedir a presença de um acompanhante durante o parto, direito garantido por lei;
Realizar procedimentos sem o consentimento da gestante, como episiotomia, cesariana desnecessária ou administração de ocitocina para acelerar o parto;
Submeter a mulher a humilhações verbais, como frases que diminuem sua dor ou questionam seu comportamento;
Expor desnecessariamente o corpo da paciente diante de terceiros;
Recusar atendimento ou retardar o auxílio médico, sobretudo em situações de emergência obstétrica.
Esses atos, além de ferirem a ética profissional, comprometem a saúde física e emocional da mulher e do bebê, podendo gerar consequências graves.
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O que diz a lei sobre violência obstétrica?
Apesar de o termo “violência obstétrica” ainda não constar em uma lei federal específica, diversas normas asseguram proteção à mulher gestante e responsabilizam condutas abusivas. A Constituição Federal garante o direito à dignidade da pessoa humana, à integridade física e psicológica e ao acesso à saúde de qualidade.
O Código de Defesa do Consumidor (CDC) aplica-se às relações entre paciente e hospital, assegurando o direito à informação, à escolha livre e à prestação de serviços adequados e seguros. Já o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) protege o nascituro e o recém-nascido, exigindo condições adequadas de nascimento e atendimento.
Outro marco importante é a Lei do Acompanhante (Lei nº 11.108/2005), que garante à parturiente o direito de ter um acompanhante de sua escolha durante o trabalho de parto, parto e pós-parto imediato, tanto no sistema público quanto no privado. Impedir esse direito configura violação legal e pode gerar responsabilização do hospital ou dos profissionais envolvidos.
O Conselho Federal de Medicina (CFM) e o Ministério da Saúde também repudiam expressamente práticas desrespeitosas no parto e defendem a assistência humanizada como diretriz obrigatória.
Segundo pesquisa da Fundação Perseu Abramo, cerca de 25% das mulheres brasileiras afirmam ter sofrido algum tipo de violência obstétrica. O dado revela a urgência de políticas públicas, capacitação profissional e conscientização social sobre o tema.
Quais são os direitos da gestante durante o parto?
Toda gestante tem direito a um atendimento digno, humanizado e seguro, com base na autonomia e no respeito à sua vontade. Esses direitos incluem:
Direito à informação e ao consentimento: nenhum procedimento deve ser realizado sem que a paciente compreenda seus riscos e benefícios e dê autorização expressa;
Direito a um acompanhante: a mulher pode escolher quem a acompanhará durante o parto, sem restrições arbitrárias;
Direito a atendimento respeitoso: os profissionais devem adotar condutas éticas, evitando comentários ofensivos ou exposição desnecessária;
Direito de recusar procedimentos: a gestante pode negar intervenções que não sejam urgentes, desde que informada das possíveis consequências;
Direito de denunciar abusos: qualquer ato de desrespeito ou negligência pode e deve ser denunciado.
Os profissionais e instituições que praticam violência obstétrica podem ser responsabilizados civil, administrativa e criminalmente. Dependendo do caso, podem responder por dano moral, negligência, imperícia ou omissão de socorro.
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Como denunciar a violência obstétrica?
Quando há suspeita ou confirmação de violência obstétrica, a mulher pode buscar amparo em diferentes órgãos:
Ouvidoria do hospital ou maternidade, relatando a ocorrência;
Ministério Público ou Defensoria Pública, que podem instaurar investigações e ações civis públicas;
Conselho Regional de Medicina (CRM) ou Conselho Regional de Enfermagem (Coren), que fiscalizam e punem condutas antiéticas;
Delegacia de Polícia, registrando boletim de ocorrência, quando houver crime;
Ação judicial para reparação de danos morais e materiais, com o auxílio de um advogado.
Guardar prontuários, mensagens, fotos e testemunhos é fundamental para comprovar o ocorrido e fortalecer a denúncia.
Como um advogado pode ajudar em casos de violência obstétrica?
O papel do advogado é essencial tanto na fase preventiva quanto na reparatória. Ele pode:
Avaliar as provas e orientar juridicamente a vítima sobre os caminhos adequados;
Ingressar com ações judiciais buscando indenização pelos danos sofridos;
Representar a gestante em procedimentos administrativos perante conselhos de classe e órgãos públicos;
Auxiliar na elaboração de notificações e pedidos formais junto às instituições de saúde;
Prestar orientação preventiva, informando gestantes sobre seus direitos antes e durante o parto.
Advogados especializados em Direito da Saúde e responsabilidade médica são fundamentais para conduzir o caso com sensibilidade, técnica e conhecimento das normas aplicáveis, garantindo que os direitos da gestante sejam efetivamente respeitados.
Busque informação e proteção jurídica
A violência obstétrica é uma forma de violência de gênero que fere não apenas o corpo, mas também a dignidade e a autonomia da mulher. Conhecer seus direitos e saber como agir é o primeiro passo para combater esse tipo de abuso.
Procure um advogado especializado em Direito da Saúde para orientar sobre o caso, reunir provas e buscar a responsabilização dos envolvidos. A informação e a atuação jurídica adequada são as principais ferramentas para garantir justiça, respeito e um parto verdadeiramente humanizado.




